terça-feira, 26 de maio de 2009

"And I hear them say: - hey, you've got to hide your love away!"



Ouvíamos Miles Davis. ´Round midnight. Hora tétrica para os solitários, e terna para os amantes. Você sorria enquanto divagávamos sobre os amores. Sorria.

Lembro desse sorriso fugidio como a impressão divina da serenidade. Estávamos serenos a dissertar sobre amores. Amores dos outros.

Os amores dos outros, dizíamos, esses que se falseiam em manchetes de revistas populares. Amores populares. Tão populares que. ‘round midnight, eram incertos, frágeis sobre palafitas de corações inseguros, ciumentos, corações exigentes e intransigentes. Coroados com a marca das instituições burguesas deselegantes e pouco criativas, os amores dos outros não amam ‘round midnight, são sombras dos primeiros acalantos, exigências dos primeiros carinhos, que nomeiam-se eternos, únicos e incondicionais. Os corações intransigentes se adiantam aos seus receios, e guarnecem-se, decaídos, sob a égide das proibições.

Ouvíamos Miles Davis e você sorria.

- Eles não podem ser sinceros!

Pensávamos como era impraticável a franqueza dos corações proibidos. Corações encarcerados não sentem senão o que já esperavam sentir, no máximo, o que convém sentir.

E como é pouco o amor que convém.

A essa altura, amávamo-nos soberbamente. Com a audácia inconseqüente dos descobridores. E “conseqüências” são apenas abstrações que pesam sobre a liberdade dos espíritos rotos. E eu sorria com você nossa fortuna e liberdade.

...

Mas que canalhas as abstrações que se materializam! Nefasta Providência, que amolece as asas dos amantes quando no zênite. Por que levaram seu sorriso?

Sucumbimos, minha amada. Nosso amor se tornou popular. Esvaneceu-se o mundo ilusório dos que são capazes de se enternecer à meia noite. Em cálidos segundos, nos desvão dos amores arrebatadores, sucumbimos à conseqüência.

...

Mas hoje, minha querida, ouvimos Miles Davis, ´round midnight, e nos atrevemos a amar afoitamente, inconseqüentes e arrogantes. Arrogantes, alçamos novamente nosso sincero desprezo pelo que convém.

Que bom rever o seu sorriso.








terça-feira, 19 de maio de 2009

"A minha escola não tem personagem, a minha escola tem gente de verdade"





A seguir, contarei uma história triste:


A primeira personagem é Amor, uma meretriz aviltada pelas bocas diversas, que de tudo ouviu sobre seu nome. Prostituta tímida, que não tem uma cara, não tem companhia, não passa do ideal dos pobres de espírito. Pobre dela. Traz no nome tudo que o mundo não tem, mas não possui, em si, o que o mundo quer. Amor é puta, Amor dá-se de qualquer jeito, Amor não passa do relicário que nunca teremos em mãos, por vinte contos de réis ou por mais de uma hora. Pobre dela, não quer mais que um lugar, longe dessas bocas desalmadas que envilecem seu nome, longe desses corpos animosos e crédulos de piedade. Amor não quer sua piedade, nem sua devoção. E são tolas as almas desse enredo, pois crêem que essa personagem lhes quererá. Amor não quer vocês, bêbedos pedantes e ignorantes. Quem lhes quer não vive esta prosa. Solidão lhes encontrará um dia.

...

Nossa próxima personagem se chama Vaidade: uma coruja sábia. Dona das vidas, enxerga mais que seus viventes. Vidente, não perde uma luta sequer. Curinga. Tem, debaixo de uma asa, o calabouço dos inseguros, e sob a outra, o cárcere dos augustos. Vilã, logra Amor, transforma-a em coadjuvante miserável, em auto-penitente cristã, pois seus seios e sua face se fazem lago narcísico para a outra. Vaidade corrompe, degenera, é cataclísmica. Sua força vem da impureza dos Homens, da idiotice Romântica de Amor e da megera beligerância dos deuses. É cúmplice de Hera – ciumenta – e carrasco de Athena – tola. É, acima de tudo, sedutora.

...

Por último, nessa trama, o Sexo. Pueril adolescente, de explosão inconseqüente e motriz. Mas que não é dotado da malícia sorrateira dos demais. É um pária aventureiro, sincero e acéfalo. Sexo é a tradução do forte bobo. É vigoroso, mas tapeado sub-repticiamente pelos algozes de intelecto voraz. Não deseja mais nessa vida que a eternidade ao lado de Amor. Doce ilusão. Já vos mostrei que aquela não se dá mais que quimericamente. Acreditou, esse tolo ídolo, que a Providência selaria tão absurdo casamento. Crente das palavras falazes da Vaidade, foi alvo de imenso engano. Este é o nosso personagem Sexo, que, pueril, como já falado, deixa-se abater pelo desleixo a que é relegado, deixa-se sobrepujar por uma Amor fugaz e indecisa e é manipulado pela Vaidade sábia e maliciosa.


Bom... O que acontece ao longo da história vocês já conhecem. É novela.


p.s. "a vida copia a poesia"




"This thunder heart, like bombs beating, echoing a thousand miles"


Recomeço.

Exaspero.

Tudo por você,

Alma.

Ma(i)s do que nunca

Ama,

Pois esquece.

Pois esqueça,

Exagero

Por tudo novo.

Nem tudo de novo.

Novas cores p´ra melancolia,

Até chegar um dia

O verde da monotonia.

Verde-tédio.

Mas até lá:

Recomeço,

Exaspero,

Grito mais alto que dantes

E todas as cores são minhas

E de longe vai ouvir seu nome

Sim, eu chamo.

Me chamo

O que teu espero.



segunda-feira, 18 de maio de 2009

"Vamos celebrar a estupidez humana, a estupidez de todas as nações."



Mantenham esses loucos presos!

Venho, em nome da normalidade, reclamar nossa luta pela harmonia social e bons padrões de comportamento. Nossa sociedade brigou incansavelmente para conseguir limpar-se e constituir-se digna, com pessoas de boa vontade e totais condições de respeito aos bons costumes, que necessito manifestar-me contra o absurdo que vêm chamando de luta.

Estamos aqui, em nome da manutenção da felicidade advinda da árdua batalha quotidiana, externar nossa indignação ante esse grupo inconsequente, que hasteia a duvidosa bandeira da igualdade, denominado “Movimento Anti-Manicomial”.

Esse discurso de inclusão é assustador. Como poderemos sair com nossa esposa e filhos num domingo ensolarado correndo o risco de encontrar um louco na rua? Como posso ir a um restaurante com a minha amante sabendo que uma das garçonetes pode ser uma recém saída de um hospício? Essas pessoas deveriam pensar na repercussão de seus atos e ideias antes de sair abraçadas a malucos e clamando para que eles saiam de suas jaulas.

Conclamo as bases que fazem o rosto de nossa modernidade – essa, tão inteligente e promissora. Senhores Psiquiatras, advogados, políticos, todos os defensores do progresso de nosso mundo, onde as pessoas podem viver tranqüilas em seus lares e trabalhos.

...

Como podemos permitir que esses insanos saiam às ruas? Eles não são capazes de entender o significado de um trabalho honesto e vigoroso, que tanto significa em nossas vidas. Um trabalho tão gratificante que sacrificamos, por vezes, o bem estar de nossos familiares, não dando conta da própria existência de nossos filhos. Mas nós, pessoas normais, conseguimos entender que é para o bem, e que só o sacrifício vai nos levar à perfeição.

Como aceitar, meus caros, ao nosso redor, criaturas com uma vida sem limites sexuais, parecendo animais que acasalam por prazer e vontade momentânea, expondo de forma vil nossas vontades mais íntimas e sórdidas. Como seria asquerosa a vida sem a repressão!

Não existe argumento válido para desbancar um sistema que há séculos logra êxito. Não há como nos convencer que, após a solidificação de um sistema seguro e os avanços da medicina moderna, abandonar tudo isso e viver à sombra de um futuro incerto, seja a melhor alternativa. Que os nomes “transtorno”, “doença”, “inadequação”, “desvio”, tão qualificadamente inseridos nos diagnósticos de nossa ciência psicológica nos soem como verdade e possamos manter os errados longe de nós.

Essa “Luta anti-manicomial” deveria, sim, ser denominada “Conspiração anti-manicomial”. Até quando ficaremos cegos até percebermos que defender tais ideias biltres é cavar a cova do nível de sociedade que passamos séculos para consolidar? Será tarde demais quando percebermos que estamos inseridos num pandemônio arquitetado por pessoas doentes?

Senhores distintos, pessoas de bem, pais e mães de família! Conclamo a todos para sairmos às ruas e fazer a nossa voz ser ouvida! Vamos dizer “não” aos pretensos defensores dessa anarquia velada! Façamos valer a força dos valores por nós arraigados! Se esses loucos (literalmente) creem que podem combater nossos direitos adquiridos, façamos o mesmo! Que fundemos o Movimento Anti-Antimanicomial!

Lutemos pela estabilidade. Lutemos para que possamos matar um mendigo ou um índio que nos incomoda, para que possamos jogar nossos filhos do alto de prédios, comprar nossa maconha e esquecer as pequenas mãos infantis que seguram as armas do tráfico, para que tenhamos nossos carros e computadores, nossas armas, e nossa poluição pois nos alimentamos dela hoje. Peguemos em armas para assassinar em nome de nosso Deus, em nome dos direitos humanos e em nome de nossos sobrenomes, pois sabemos o que é bom e o que é mau. Em nome de nossa pátria. Ora, os loucos não têm pátria, não entendem o significado de sujar as mãos de sangue para vencer o inimigo.

Peguemos as armas que a ciência nos dá em nome de nossa mediocridade e defendamos a bandeira da normalidade

Nossa liberdade depende de mantê-los presos.


Mattos & Machado

sexta-feira, 15 de maio de 2009

"life is what happens to you while you´re busy making other plans"


Prosa e Conto

Na sua história falta poesia
Você não sai de casa com medo do dia
Você não faz mais nada. É o medo da vida!
Escreva uma nota pra pessoa amada,
Recite a trova na hora maior.
Escreva um pouco pra esquecer da dor,
E despreze um pouco da chuva lá fora
Olhe o sol se pôr
Fique sonhando com o mar,

tentando escrever
A saudade na estrofe seguinte.
Todas as contas da próxima métrica,
E os dilemas que a cor há de ter.
Escreva uma rima para agradar ao dia,
Agradeça ao dia por estar a escrever.
Na sua vida falta poesia.
Falta alguém que lhe ensine a ler
O dia, o sol, a chuva,
A cor, o sonho, e a escrita
Na sua poesia falta a história
Faltam os contos de moral solitária,
Falta a lenda do eterno aprendiz.
Falta, ainda, a verdade,
O caminho e o pensamento
Na sua história falta poesia.
E o resto é só história.


quarta-feira, 13 de maio de 2009

“Everyone hates a bore, everyone hates a drunk. Everyone hates a sad professor”

Apesar de ser a própria incorporação do conceito, não deixo de me impressionar, encantado, com a capacidade taoística da música. Ela simplesmente é tudo, está em tudo. Está no seleto grupo de elementos que nossa limitada linguagem não consegue dar conta. Vi, certa vez, Joseph Campbell afirmar, referindo-se ao valor metafórico dos mitos, que as melhores coisas da vida são aquelas pelas quais perdemos a capacidade de traduzir. Música é isso. Quem nunca se perdeu em palavras aleatórias, por vezes contraditórias, tentando achar uma que elucidasse como uma música o fez sentir?

Os elementos considerados mais transcendentes nas diversas práticas religiosas envolvem a música. Os mantras entoados são o veículo de maior elevação espiritual de algumas religiões orientais.

Todo esse percurso é para ilustrar a relevância em lembrar que essa senhora habita os emocionados e ébrios discursos às mesas de bar. Sempre.

Hoje, cativado pela composição que inspirou o nome signatário do blog, lembrei-me de uma categorização que fiz, há algum tempo, na supracitada situação.

Vou desconsiderar os níveis hierárquicos mais baixos da classificação e me prender aos dois principais: os bons letristas e os geniais. Claro que vai haver discordância nos nomes incorporados a cada categoria, mas isso nada importa. Dou ênfase ao conceito. Vamos a eles.

Os bons letristas são os que conseguem fazer ser relevante o que está escrito. Também não gastarei latim discutindo o que estou chamando de “relevante”, confio nos leitores. Os geniais elevam-se do relevante. Esses escrevem algo que fica para além da melodia que acompanha – claro que a musicalidade não deixa de existir. No sentido prático, são líricas que podem/ merecem ser recitadas.

Quando pensei nisso, estava recitando “Refrão de bolero”. Um poema!

Michael Stipe. Considero um dos maiores poetas – ainda vivo – do rock. Experimente recitar “Why not smile” ou “Diminished”.

Recentemente, aprendi a poesia de Dave Grohl. Os versos “your´re not alone dear loneliness, you forgot but I remember this” não são apenas recitáveis, eles merecem ser gritados no que Saramago chamaria de “conversar com o teto”.

Não me deterei à mais versos, mas sugiro como exercício de encontro com a genialidade recitarem “Across The universe” (do poeta Lennon), “O mundo é um moinho” (do poeta Cartola), “tigresa” (do poeta Veloso), “Mar e lua” (do poeta Chico) e “Viernes 3am” (do poeta Herbert).

Um bom dia a todos e

Fiquem com a música!

terça-feira, 12 de maio de 2009

"Eu não te completo, você não me basta, mas é lindo o gesto de se oferecer"



Maldita sina essa, dos amantes:

Não ter p´ra sempre o amado.
Maldita sina dos amados:
Não ter p´ra sempre o amor do amante

E quando a sina é dos cantantes,
Nem sempre é real o amor falado.
Mas como são poetas e desnaturados,
Imaginam um tal de Amor,
Que se faz nos leigos, desejado.

Maldita ousadia dos poetas,
Somente pelo seu desejo maltratados.
Pois mesmo que feliz um beijo,
Faz-se um poeta, amargurado.

E maldita a lição desses poetas
De coração desembestado,
Inconseqüentes, sem pesar
De nossa sanidade.
E agora, no acre do amor que cremos,
Não nos satisfazemos
Com a poesia da saudade.


“Voltei a cantar porque senti saudade”

Não pude dizer isso sem aspas porque um Chico disse antes, mas aqui posso citá-lo sem colocar ano e página.
Voltei a escrever porque senti saudade.
É fato conhecido de meus amigos o carinho que tenho pela palavra escrita. Carinho que fornecerá os ingredientes de vários textos por vir. E antes de iniciar mais essa aventura blogueira, tenho alguns débitos a comentar.
Devo minha distância desse mundo à minha preguiça e à prezada educação formal. Mas à última, também devo minha retomada da vontade de escrever. Não me conformo – ainda que entenda – com um fato: o lugar que mais nos faz escrever transforma esse ato em algo sacal. Para mim – essa expressão será implícita em todos os próximos textos - escrever é expressão de alta liberdade, concordam? Então o que fazemos na Academia é apenas esboçar, ou redigir.
Vejam bem, caros leitores, (prepotência de que haverá plural aqui) eu não preciso colocar a referência da música supracitada. Se você não conhece, não sabe o que está perdendo. Se a conhece, encontrará cada verso esparramado por aqui. Aí está uma grande falta da ciência para o escritor, ela não nos permite a ironia. O subentendido é escamoteado. Pobre dele! Entretanto não é novidade que na exclusão se faz ciência e vice-versa. Pergunto-me se a falta de espaço para o sarcasmo é por questões metodológicas ou por serem incapazes de entender mesmo. Eis que recorro à psicanálise porque ela sim, para a qual a ciência moderna olha suspeitamente, incorpora a ironia. Minha ignorância sobre o tema me faz parar por aqui.
Devo agradecer ao meu irmão, Breno, que está fazendo o layout do blog enquanto eu escrevo essa introdução.
Por último, devo agradecer meu retorno a minha amiga Raquel, que não faz idéia da importância que está tendo agora. A frase foi simples e, por isso, do meu tipo favorito: - você não é pesquisador, é literato!
Aguardo ansiosamente a companhia de vocês nessa empreitada de idéias contraditórias, textos de referencial duvidoso, súplicas arrogantes e inocência Romântica (e que saudade de falar desse erre maiúsculo!).
Yes, I can!