segunda-feira, 3 de agosto de 2009

"Still I try to find my way, spending hours, endin' days, burning like a flame behind my eyes"


Ela, a primeira, não entrou por acaso. Tinha o dom de me saber. E como sabia. Foi ,sabendo sobre mim ,que sussurrou. Foi, de tanto eu também saber, que ouvi o sussurro como uma oração. E ela me pedia socorro, e eu atendia. E assim soubemos um do outro. Ela suspirando e eu atendendo. E como uma oração, nutrido pelas promessas e pisoteado pela realidade. E assim soubemos que não bastava sabermos um do outro. Ainda sabemo-nos, mais que ontem, e por isso, talvez, rezemos um pelo outro.

Ah! A segunda. Digna de pensamentos sórdidos, e cálida como freira. Nossas noites desenhavam o Rio. Descobríamos, descobríamos e descobríamos. Ela descobria o primeiro amor. Eu descobria as primeiras tentações. Sua descoberta tinha medo da minha. A minha, medo de dar as caras. As tentações são o universo do coração jovem, são a criação e apocalipse, Brahma e Shiva, criam, massacram, atormentam, destroem e renovam. Dessa vez nos separou. E recriou.

Como o terceiro de Teresinha, a terceira me negava tudo, não dava nada. E, por mera coincidência, ela ficou. Coincidiram muros, desesperanças e desalentos. Tanto vazio bem que engendrou. Tanto nos negamos que explodimos num Sim para sempre. Era certo, era sempre, era poético, era Romântico. E por Romântico nunca morreu. Mas uma alma muda. E, por coincidência, mudamos juntos. As almas mudaram para distantes umas das outras. O que ficou do primeiro abraço foi um mundo, cercado pelos muros que outrora impediram a construção desse mundo. Ele sobrevive, em algum lugar do universo, sendo desgastado pelo tempo, apenas sobrevive. E as almas andam.

E as almas que se atrevem a vagar, correm sempre o risco de pousar de repente, sem planos, sem esperar, sem esperar nada. E assim essa alma encontrou lindo lugar para aterrissar. Não mais que duas semanas ela ficou. E a alma e o lugar não viraram corpos, continuaram almas e cresceram almas. Inflaram se saboreando, uma alma cativando a outra, recitavam-se Caetano, cantavam-se Manoel de Barros. “Do lugar de onde estou, eu já fui embora.” Fui, então. Sem tempo para dizer adeus. Deixando de ser alma. Sem tempo para vagar demais, pois a alma grande pesa ao corpo. E corpo e alma tendem a se cansar.

Mas a alma ousada, teimosa, atentou outra vez contra a sanidade. E me trouxe o inesperado. E se a alma cansada vê-se defronte ao inesperado, ela recorre à não pensar. E não pensando, essa alma me pregou uma peça. Fez-me amar um amor sem lógica, digno dos bufões. E por ser clown, foi belo. Daqueles sem explicação, sustentado apenas pela ilusão. Daqueles que nada importa, porque realmente nada importa. Eu lhe dei um corpo e ela me deu uma alma nova. Um novo sopro de alma para aquela já tão cansada. Éramos felizes, como os bufões, que nas “tardes de domingo choram”. E chorávamos a alegria e a desesperança. Não a mesma de outrora. Essa desesperança não tinha cartas do passado. O futuro arrancava, pouco a pouco, lágrimas, que endureceram a alma. E na despedida – como o futuro nos dissera – a alma daqui se sentiu calcificada.

Mas vejam como as coisas são! Mesmo a mais dura das almas tem suas fraquezas. E justamente por tão rija, tão frágil. Tão frágil que foi sugada, arrebatada, sem tempo de se esquivar, de se preparar. E ainda sem se recuperar da tontura de amar mais uma vez, já amava ao som do jazz, já tinha corpo que transpirava e vociferava os palavrões do amor carnal, rock ´n roll, já se deliciava em conversas de travesseiro bossa nova. Em todos os ritmos trazia todas as forças do passado. Os desalentos, Brahma e Shiva, Caetano e o Clown. Tonto, num mesmo amor, era chama plácida e pudor cético, esquerda e direita, ódio, desalento e Vaudeville.

E sem blasé, eis que vaga a alma, que tantas almas foi e o é. Alma do saber, que descobre, que foge e dança, recita e some, é estúpida e ama, pasma e se entrega sem resistir. Enquanto isso, Ela dorme sobre minha mão.

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